Das broncas por rabiscar nas paredes de casa, às ilustrações dos livros de ninguém mais, ninguém menos, do que Rita Lee, a Rainha do Rock Brasileiro.
O trabalho do ilustrador Guilherme Francini tem ganhado muita visibilidade e se tornou uma referência em obras infantis. Nascido em São Paulo e formado em design, com pós em animação, o artista nos contou que foi em 2019 que ele começou a se dedicar de vez ao desenho, com o convite da Rita Lee para ilustrar o livro "Amiga Ursa". Depois disso, além de outros livros da Rita, Guilherme também ilustrou obras da Xuxa e da Luisa Mell. Todas tratando de temas sensíveis e atuais, como a causa animal, a dupla maternidade e até mesmo a morte.
Em entrevista exclusiva para Yellow Mag, Guilherme nos contou um pouco mais sobre a sua trajetória, suas ideias, inspirações e deu dicas valiosas para quem está começando. Se interessou? Confira, abaixo, a íntegra da conversa:
Yellow Mag: Como/quando você começou a desenhar?
Guilherme Francini: Eu sempre fui apaixonado por desenhos e por desenhar. Quando criança, rabisquei todas as paredes de casa! Lembro de assistir em loop as fitas VHS da Disney, a Cinderela e a Branca de Neve eram minhas preferidas.
Nessa época, já dizia para os meus pais que queria ser desenhista quando crescesse. Lembro da minha mãe me mostrar uma arte abstrata e dizer “meu filho vai ser um artista!” e eu responder “não, eu quero fazer de-se-nhos”.
Mas abandonei essa paixão durante a adolescência e só fui retomar aos 20 anos de idade, quando larguei a faculdade de Administração para estudar Design. E fui me dedicar de vez para o desenho, com o convite da Rita Lee para que eu ilustrasse o livro "Amiga Ursa".
Yellow Mag: Como foi a decisão de se tornar ilustrador profissional e criar a sua identidade visual?
Guilherme Francini: A Rita Lee decidiu por mim! Um belo dia, enquanto conversávamos, ela simplesmente disparou: “eu estava escrevendo um artigo para um jornal sobre a ursa Marsha [que foi traficada da Sibéria para o Brasil, e, após anos de maus-tratos, ficou conhecida como ‘a ursa mais triste do mundo’], mas acabou virando um livro infantil. E eu quero que você o ilustre!”. Em uma fração de segundo, passaram três filmes na minha cabeça: eu poderia dizer “não” e passar o resto da minha vida pensando no “e se?”; eu poderia topar, não dar conta do recado, e acabar me queimando; e eu poderia topar e dar tudo certo. A última opção, felizmente, foi o que aconteceu!
Logo após o convite, eu investi em um iPad Pro e em um curso online de ilustração infantil. A minha identidade visual se desenvolveu na correria, aos trancos e barrancos, durante a feitura do livro ‘Amiga Ursa’. Como eu sempre gostei muito do universo da ilustração, já tinha um gosto bem definido. E isso me ajudou a focar em um estilo mais clássico, com luz e sombra, e uma paleta de cores mais naturalista.
Yellow Mag: O que mais te inspira? Desde filmes, séries, até cantores/bandas, literatura, etc.
Guilherme Francini: Eu me inspiro muito nas coisas que gostava quando criança. Fui um leitor ávido de “Harry Potter” e “Desventuras em série”. Ficava viajando nas capas, nas ilustrações e até nos projetos gráficos dos livros. Mesmo criança, dá para perceber quando algo é bem pensado, sabe? As animações clássicas da Disney, com as concept-arts da Mary Blair e de outros artistas incríveis, também sempre me inspiram demais. E, claro, as minhas autoras, quando penso na Rita Lee, na Xuxa ou na Luisa Mell, e já me vem várias ideias de cenas, cores e atitudes.
Yellow Mag: Quais artistas plásticos te inspiraram para se tornar um ilustrador? Quais as suas referências? Você se inspira em algum estilo específico que a levou a criar a sua identidade artística?
Guilherme Francini: Apesar de sempre me sentir atraído por tudo o que é “clássico e fofo”, não posso dizer que me inspiro em um estilo específico. Em relação a referências de artistas, gosto demais do trabalho das lendas Mary Blair e Maurice Noble. E também dos contemporâneos, Mary Grandpré, que deu um rosto para o Harry Potter, e do Brett Helquist, responsável por toda a identidade visual das “Desventuras em Série”.
Yellow Mag: Você já trabalhou com desenho à mão antes de passar para a ilustração digital? Se sim, como foi o processo de entrar no mundo da ilustração digital?
Guilherme Francini: Profissionalmente, não. Apenas algumas tentativas durante a minha formação: em cursos livres de desenho, na faculdade de Design e na pós-graduação em Animação. Mas ainda não tinha noções de pintura e nem desenvolvido o meu estilo como é hoje. Tenho muita vontade de explorar mídias tradicionais, como lápis-de-cor e giz-pastel. Mas, agora, com o meu conhecimento e identidade visual atuais.
Yellow Mag: Você tem um ritual para começar a trabalhar em uma arte nova? Por exemplo, colocar uma música, algo assim?
Guilherme Francini: Eu rezo, mentalmente, para que saia algo bom! (Risos).
Yellow Mag: Que dicas você ofereceria ao pessoal que se interessa em aprender ilustração digital e buscar uma identidade visual própria?
Guilherme Francini: A ilustração digital é bem parecida com a tradicional, você só não fica preso à fisicalidade do processo. E sempre dá para apertar o "ctrl+Z" (risos). Então, eu dou duas dicas que servem para todos: a primeira, estude! Nossa vida é muito curta para a gente querer reinventar a roda. Se eu não tivesse investido em educação, jamais chegaria sozinho aos conceitos de design, de desenho e de pintura que são fundamentais para o meu trabalho. Então, pegue um bom livro, ou vá fazer um curso, que te mostre o caminho das pedras.
A segunda dica, mais voltada para identidade visual, é: abrace algumas "falhas". Alguns dos ilustradores que eu mais admiro, desenvolveram um estilo único por ter dificuldade para desenhar em perspectiva, por exemplo. Resumindo: a sua técnica e o seu estilo virão através de uma combinação entre conhecimento e autoconhecimento.
Yellow Mag: Como foi trabalhar com a Rita Lee, Xuxa e Luísa Mell?
Guilherme Francini: Foi, e está sendo, um sonho! Aliás, é o tipo de coisa que eu jamais ousaria sonhar: trabalhar com três mulheres tão fortes e cheias de propósito. Agradeço todos os dias à minha fada-madrinha, Rita Lee, por estar vivendo tudo isso.
Yellow Mag: E quais os planos para o futuro no seu trabalho? Há algum projeto em mente que você queira compartilhar com os leitores?
Guilherme Francini: No momento, eu estou trabalhando na continuação da série de livros infantis da Luisa Mell, "Se os bichos falassem". Só posso dizer que, para além de toda a temática de consciência ambiental e respeito aos animais, ele está ficando liiindo!
Esperamos que essa conversa com o Guilherme Francini possa ter acrescentado pra você tanto quanto acrescentou pra gente.
Seu mais recente trabalho de ilustração lançado é o livro Mimi: a vaquinha que não queria virar comida. Livro infantil onde Xuxa Meneghel aborda uma pauta urgente: o consumo alimentar no contexto da crise climática. A obra da apresentadora é pensada como forma de introduzir o assunto, tão complexo quanto necessário, ao universo infantil.
Para continuar acompanhando o trabalho do Guilherme Francini, visite o seu site e rede social.
Muito obrigado, Yellow Mag, por me convidar para uma entrevista tão linda e completa! Vocês são 💛